quarta-feira, 25 de agosto de 2010

TRABALHAR PARA VIVER OU VIVER PARA TRABALHAR?

Todos nós possuímos desejos diferentemente variados, sejam eles para o momento ou para o futuro, o que é saudável, mas na sociedade em que vivemos todos os desejos estão atrelados ao desejo de consumo, o que significa manter-se na moda, usar determinadas marcas, para assim ter status e viver, conforme rege hegemonicamente a sociedade do consumo.

Para consumir precisamos ter dinheiro e isto significa trabalhar para consegui-lo, foi o que Antônio fez a vida toda. Ele era um trabalhador que todos os dias fazia hora-extra, trabalhava aos finais de semana, era elogiado pelos superiores e até há pouco tempo tinha motivos para se alegrar, porque recebia bem para isto e ainda lutou a vida toda para estar onde estava. Contudo, o fiel trabalhador está muito triste, porque apesar de ter comprado seu carro popular usado, ano 97, em bom estado de conservação e de se tornar refém de um financiamento de duas décadas para comprar uma nova casa, Antônio passou muitas horas trabalhando e não viu os filhos crescerem, não participou das datas festivas da família, perdeu muitos momentos da vida familiar, comunitária e social, momentos que não voltarão. Hoje Antônio tem seu carro para poder sair com os amigos, pode se dar ao luxo de talvez até fazer um churrasco no final do ano, quando terá uma folga, mas alguns amigos já não moram mais na sua cidade e outros estão trabalhando como ele.

Antônio hoje está doente e pensa em vender o carro para pagar um tratamento de saúde particular, agora ele sabe que o trabalho excessivo adoece, mas o que agravou a doença do nosso amigo é saber que graças ao seu esforço no trabalho o seu chefe vai vender a empresa para se mudar para o Litoral, onde comprou uma casa de praia e fará uma grande festa para comemorar com a família. A mulher se separou de Antônio porque ele não tinha tempo para ela e nem para os filhos. Agora Antônio está sozinho, deprimido, estressado e tem medo de ser demitido pelo seu novo chefe.

Por esta história podemos perceber que consumo é realização momentânea que não traz realização plena justamente pela momentaneidade, daí decorrem as grandes frustrações da nossa sociedade: depressão, estresse, angústia e culpa. Vivemos hoje um período de intenso materialismo em que qualquer cidadão sente um desejo, senão, necessidade de consumir, de comprar e gastar, mas até quando seguiremos esta lógica da sociedade em que a disputa, a corrida e o extremo individualismo prevalecerão? Em que as vidas são vendidas ou prostituídas nas relações de trabalho, em que excessos e esforços não são medidos e a família é deixada em segundo plano?

É o que o nosso amigo se pergunta hoje, ele errou porque se esqueceu o quanto é curta a vida, se esqueceu de aproveitar as pequenas coisas da vida, não compensou o trabalho com o passeio de bicicleta com os filhos, se esqueceu do xadrez que os amigos de infância realizavam todo domingo à tarde e há décadas “pendurou as chuteiras” e largou o futebol do fim de semana. Antônio não trabalhou para viver, entretanto, podemos dizer que ele viveu para trabalhar.
Uma citação de Guerra muito me chamou a atenção:

A formação profissional do assistente social tem que ser analisada no contexto das relações sociais mais amplas que movimentam a ordem burguesa constituída, das demandas e requisições que o mercado de trabalho nos coloca neste final de milênio e, ainda, das tendências do movimento da realidade, das respostas que estão vindo da sociedade civil, dos movimentos sociais, sindicais e populares (Guerra, 1997).

É desta forma que um movimento social é reflexo da sociedade civil e o assistente social deve compreender as relações sociais advindas deste contexto para descobrir, compreender e atender as demandas sociais de um movimento social.

REFLEXOS DA SOCIEDADE CONTEMPORÂNEA: OS EFEITOS DA PADRONIZAÇÃO, A NEGAÇÃO INCONSCIENTE DO “SER SUJEITO”

Na contemporaneidade da sociedade capitalista, como síntese do desejo inconsciente individualista-dominante do “todo social” que constrói continuamente o sistema dominante e vigente a partir de uma hegemonia da esfera econômica que implica ao sujeito dominar e ser dominado muitas são questões que merecem reflexão.

Este ser dominado advém do desejo de domínio que sintetiza-se rumo a uma autonomia global frente à sociedade como um todo. Desta forma, observo alguns reflexos e efeitos sociais, dentre os quais, os reflexos da padronização na totalidade social.
A esfera econômica, hegemônica sobre todas as outras desde sua ascensão no seio da classe burguesa por meio da acumulação primitiva, exige para manutenção de sua própria existência, a produção e o consumo, o que implica estar sempre criando meios, formas, técnicas e tecnologias.

Neste contexto histórico-social, dentre os vários modelos de expropriação e acumulação de capital, emergiu a padronização, onde padronizar é o “parece ser”. Deste modo, temos uma sociedade do “ter” que “parece ser” e não do “ser” que implica emancipação do indivíduo frente à vida social, ou seja, ser sujeito. Todavia, não busco uma reflexão economicista da ou na economia ou produção, mas dos e nos efeitos da padronização na esfera social.

Todavia, padronizar a vida na sua totalidade social, é aceitar o que vem de fora de forma proporcionalmente acrítica, ou seja, na mesma proporção em que por meio da ideologia dominante e alienante nos tornamos mais padronizados, mais acríticos ficamos e quanto menos senso crítico temos, mais alienados nos tornamos frente à sociedade espetacular. Somos indivíduos que acreditam serem sujeitos, mas que não são de fato, apenas acreditam, porque são sujeitos do espetáculo (Deboard). O “ser sujeito” está sendo mascarado de forma espetacular ao passo que ele também parecer ser, mas não o é de fato.

Frente ao movimento de padronização da vida está o indivíduo ou o sujeito espetacular que nega a si, nega sua essência ao espelhar-se nos padrões sociais de beleza, estética, comportamento e consumo que são vomitados pelas propagandas também padronizadas, onde recebe desejos, necessidades e valores modelados e padronizados e opções de escolha que lhe são dadas arbitrariamente e imparcialmente geradas do sistema e para o sistema, buscando a morte do seu “eu” em prol destes padrões, despersonalizando o indivíduo ou sujeito espetacular que proporcionalmente torna-se mais alienado. Desta negação inconsciente que é o desejo individualista-dominante do “todo social”, que se formou e se forma a alma do sistema vigente erguido sob a esfera econômica na contemporaneidade.